A ameaça principal está nos preços de bens não duráveis, como calçados, vestuário, utensílios e enfeites, que cresceram 9,25% em 12 meses
Iuri Dantas
BRASÍLIA - A inflação no Brasil vem desacelerando em direção à meta de 4,5%, em linha com o cenário elaborado pelo Banco Central. Mas isso não significa preços mais baixos. A assistente administrativa Eneide Chaves Custódio, 49, por exemplo, vem percebendo que roupas e brinquedos importados da China estão mais caros na prateleira. A consumidora confirma a pressão sobre os preços que vêm da Ásia: o Brasil está importando parte da inflação chinesa.
"Com a presidente não está tão ruim, mas não é mais tão bom quanto era com o Lula", diz Eneide. "Antes a gente sentia mais segurança", afirma. "E essa coisa do Banco Central depende mais da política do governo", acrescenta, ao ser indagada sobre o comportamento da inflação e a atuação do Banco Central. "Os brinquedos estão bem mais caros do que em qualquer época e as roupas estão custando mais também."
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O comportamento da economia chinesa provoca um impacto direto e outro indireto nos preços do País, conforme explica o ex-secretário de Política Econômica Julio Gomes de Almeida.
De um lado, o apetite do gigante asiático por matérias primas - as commodities - pressiona cotação de produtos como cobre e trigo. Esses itens, que o Brasil precisa importar, acabam chegando mais caro ao País.
Por outro, houve elevação de custos de produção na China, por conta de salários mais altos. E isso resulta em manufaturados mais caros.
"Bens intermediários e de consumo já estão um pouco mais inflados pela inflação chinesa", afirma Almeida, que atualmente preside o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI). "A China deixou de fazer exportações ‘desinflacionárias’, como nos anos 1990 e 2000. E agora exporta inflação. Isso vai continuar assim: o conteúdo inflacionário veio pra ficar", afirma.
Pressão
O principal fator de pressão sobre a inflação brasileira não é mais o
preço de serviços, segundo dados compilados pelo Banco Central. O valor
cobrado por serviços, tais como manutenção de automóveis e
cabeleireiros, subiram 9,03% nos 12 meses encerrados em setembro. Agora,
a ameaça principal está nos preços de bens não duráveis, como calçados,
vestuário, utensílios e enfeites, que cresceram 9,25% no mesmo período.
Estes itens, somados a bens semiduráveis - como artigos de limpeza e
produtos farmacêuticos - representam 38% do índice oficial de inflação
do País, calculado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE). As duas categorias também são as que mais reagem aos preços
chineses, colocando em risco uma possível queda do custo de vida
brasileiro.
As importações de calçados da China, por exemplo, cresceram 19% nos
primeiros nove meses de 2011, em relação ao mesmo período do ano
passado, enquanto o preço médio da unidade subiu de US$ 4,93 para US$
6,28, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e
Comércio Exterior. Nas contas do IBGE, o preço de calçados teve um
incremento de 8,74% nos últimos 12 meses encerrados em setembro.
O preço médio do brinquedo chinês também subiu, como notou Eneide. O valor passou de US$ 1,21 para US$ 1,46 no mesmo intervalo.
Parte desse aumento teve a ver com o governo nacional, que em
dezembro aumentou de 20% para 35% a tarifa de importação, afim de
proteger o fabricante nacional. Mesmo assim, as importações cresceram
38%.
Sabão e material de limpeza, cujas compras feitas pelo Brasil da
China subiram 61%, também estão custando mais. Foram importados a US$
2,05 por quilo de janeiro a setembro do ano passado. Este ano, no mesmo
período, o preço passou para US$ 2,37.
Transmissão
"O salário na China está subindo e os custos estão aumentando", diz
José Augusto de Castro, presidente em exercício da Associação de
Comércio Exterior do Brasil (AEB). "As empresas chinesas têm que
repassar esses custos maiores, é possível que estejamos trazendo um
pouco de inflação de lá para cá", avalia ele.
"Mas quando conversamos com algumas empresas, vemos que houve
aumento. Mesmo assim, o preço chinês ainda continua muito mais vantajoso
em relação ao nacional", acrescenta.
Outro canal de transmissão da inflação da China para o Brasil são os
insumos utilizados pela indústria nacional. O empresário nacional,
segundo Castro, é quem vai decidir se repassa ou não esses custos
maiores para o consumidor.
Pelo sim, pelo não, a arquiteta Ciane Gualberto Feitosa Soares, 56,
evita produtos "made in China". "Uma vez fui comprar cobertor e me
ofereceram um da China", diz ela. "Li no jornal que a China também está
na crise e que isso vai afetar o Brasil. Então, comprei um nacional, um
pouco mais caro, para ajudar."
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Tags: inflação-China-Brasil, comércio-internacional, corrente-comércio, mercado-chinês, exportações-importações-brasileiras
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